Já pensaram os meus leitores no poder expressivo do verbo “arrancar”, tão vulgarizado na linguagem
comum? Pois deem-lhe um ambiente poético e ele irá retribuir-vos o jeito. Será
generoso convosco. Permitir-vos-á aceder ao vosso peito magoado, doído; ao
timbre próprio dos gemidos de alma.
No Dicionário do Português Atual (edição de 2011) de António
Houaiss, pode ler-se, a propósito da entrada “Arrancar”:
“Verbo bitransitivo (i.e. não é só o que se arranca, mas a quem se arranca);
tirar, arrebatar, extrair fazendo uso da força; estar a agonizar; a morrer”.
Repare-se na violência do alcance semântico deste verbo. Arrancar pressupõe o uso da força
adversa que nos pode levar à agonia e mesmo à morte. Disso nos deu boa conta
Saramago:
“Arranca metade do meu
corpo, do meu coração, dos meus sonhos. Tira um pedaço de mim, qualquer coisa
que me desfaça. Me recria, porque eu não suporto mais pertencer a tudo, mas não
caber em lugar algum”.
Pois cá vai:
Tirem-me
o lugar onde fui nascido,
Tirem-me
do sério, tirem-me da vida,
Tirem-me
deste poema que não rima,
Tirem-me
um rim, tirem-me o sangue.
Extraiam-me
o dente do siso
(que
quero ser menino).
Acabem
com o que me resta.
Extraiam-me
o peito quase vazio,
Roubem-me o sorriso (se o houver),
Extorqui
de mim o que vos sirva.
De
tudo, levem-me um pouco.
De
tudo, aguento o que seja,
Mas
não me levem…
Não
me levem…
Não
levem…
Não!
Não
arranquem…
Não
me arranquem…
Não
arranquem de mim…
Não
me arranquem o amor, por favor!
Esse
é meu. Cativei-o.
Prendam-me
a ele.
O autor? É o
que menos importa.
Ui! Que lindo!
ResponderEliminarA poesia liberta-nos.
Obrigado, Letícia. É, a poesia tem esse poder especial. Liberta-nos, faz-nos companhia e é uma ótima confidente.
EliminarChorei e a culpa é tua, Alcídio.
ResponderEliminarDizes-me que é o autor desse poema?
Hoje, descobri que alguns comentários são guardados em spam. Uma chatice, pois estava lá o teu. Quase um ano volvido, peço-te esta desculpa serôdia.
EliminarSobre a autoria do poema, respondo-te da mesma forma que respondi ao outro anónimo: uma vez escrito, o poema deixa de ser de quem o criou. Espalha-se pelo mundo e entra em nós como pertença. É meu, é teu... é de todos os que o adotaram.
Fizeste-me chorar, Alcídio.
ResponderEliminarGostava de saber quem escreveu o poema. Dizes-me?
Não sei com quem estou eu a dialogar, mas isso não importa para o efeito.
EliminarVou responder-te desta forma: uma vez escrito, o poema deixa de ser de quem o criou. Espalha-se pelo mundo e entra em nós como pertença. É meu, é teu... é de todos os que o adotaram.